Nome do Escritor: Nemilson Vieira

Data de Nascimento: 14/10/1958

Saudade de Minha Terra

Saudade sua é mato que não raleia… lembranças que não saem, centelhas que incendeiam. — Me ponho a relembrar de tudo por lá… do entardecer, do cantar do galo no amanhecer; das batidas da cancela no mourão, do som do chocalho e do mugido do gado na pastagem ou deitado a remoer. Saudade do luar do sertão, que à terra toda prateia, lembranças de um passado distante que o pensamento campeia... Meus pés ganharam o caminho, ao frescor da memória a impactar o meu sentir… Ruas, estradas, trilhos, atalhos, encruzilhadas… dão-me a esperança de seguir. E a poeira dos meus calçados, com o pó esbranquiçado (pelos meus passos) é a prova do quanto andei.
Saudade da minha gente querida: mamãe, papai, irmãos, amigos, moradores do lugar que fui criado; de acontecimentos memoráveis, de pessoas, que, o meu coração se pôs a amar, e a mente foi longe ao lembrar… de seu Joaquim Batista (Quincão) no percurso que fazia, na calmaria das ruas em passos macios, meditativos; e dedo de prosa com amigos. — Sempre com às mãos pelos bolsos, chegava devagar, calado, nas rodas de conversas; e saía da mesma forma: de mansinho, silencioso, sem se despedir.
Sempre vêm a mim, boas lembranças de ti, minha terra; das pescarias feitas com os velhos amigos: Zé Cafubira, que tecia e remendava suas próprias tarrafas, redes de pescas, e nos contava suas histórias mirabolantes de pescador... de Congo de Ouro (militar da reserva?), que nos falava do seu passado de glória na gloriosa força pública goiana; dos seus atos de bravuras, das honras recebidas da corporação… dos desafios da vida... Ao ser preso, fiz uns versos a ele, que ao chegar ao seu conhecimento não gostou. — Mas, depois de solto se acalmou; e fui salvo pelo gongo. Saudade do Bira de Maninho, do futebol alegre que jogava e dos seus gracejos, e imitações do jeito de falar do mineiro interiorano, que só ele sabia.
Me vem à mente, o lendário Inácio (Inação) com os seus causos, a fazer seus cigarros de fumo-goiano, que picava com seu canivete corneta, e o desfiava na palma da mão; agasalhando-o numa palha de milho; e pondo fogo no mesmo, após cuidadosas lambidas.
Saudade dos fregueses do tio Elias, da turma do “gole” do meu passado: Mané da Hora (que se converteu a Cristo e mora com Deus), Penteado, Aristeu, Crispim, Gaúcho, Pedro Gambá, Zezinho Cearense, Zezão, Inezinha, Mané Moitinha, Zé do Rádio, Bilu Teteia, Zé Melado, João Rolinha, Barrão… Dos pássaros do lugar: rolinha caldo-de-feijão (que na seca, em cânticos dolentes, chamam a chuva e a chuva não vem), fogo apagou (carinhosamente tratada por alguns como Galinha de Nossa Senhora), das saracuras três potes nas cantorias em dupla, às tardes e madrugadas. Do bem-te-vi, que, nas suas cantorias parecia dizer que bem me via, e após as coletas, engoliam seus insetos prediletos; gavião penacho, piem, famintos, a voarem felizes a conduzirem o alimento (para si e para à prole): pinto fresco, nas garras.
Saudade das andorinhas que iam e retornavam, sozinhas ou em bandos, em revoos, sobre a praça central da minha cidade. A se abrigarem no prédio da prefeitura e no antigo templo católico local. Por lá construíam os seus ninhos, cuidavam das suas proles; sujavam o saguão paroquial, os santos, os bancos, o altar, com seus excrementos. Dos tucanos, com seus enormes bicos, ao me olharem de cabeça torta, a procurarem seu frutos prediletos, e as proteínas necessárias, nos ninhos com ovos ou filhotes de aves. — Das araras, que, em família ou em pares, voavam comunicando-se, o tempo todo nos ares, entre si; indo aos buritizais ou retornando deles ao repouso do dia… — Dos ariscos tico-ticos, que amavam os quintais nas coletas de pedrinhas.
No tempo das mangas e do milho-verde nas roças, os periquitos, as maritacas em família, tingem o azul do céu, em verde-mar; nas suas algazarras, na grande festa do ano (as colheitas anuais), em mangueiras e milharais…
Saudade das árvores urbanas: do tamboril, do jatobá da pedrona; das mangabas, do pequizeiro do cerrado, em flor a exalar bom odor; da pimenta-de-macaco que nós, humanos-meninos comíamos.
Saudade da Vila Baiana (onde fui criado), do brejo da biquinha (espaço suprimido pela ação humana ou desumana?), saudosista que sou, parece que ainda ouço o farfalhar das palhas ao vento, do buritizeiro do brejo da biquinha. E tenho saudade do araticum do cerrado, feijão-de-corda, andu, farinha sertaneja torrada, paçoca de anta, de onça e da carne de sol do Juá… — Da Maria Benta e seu espetacular tempero… Saudade lá de casa: da comida farta, e dos familiares em volta da mesa. — Dos cajuzinhos do campo, das primeiras águas; do subir da Serra das Almas, do Morro da Cruz; e do sangue-de-cristo (frutinhas nativas de campo aberto).
Tenho saudade e não vou mentir, de tudo e de todos da minha terra; até do que não vivi no lugar: dos pioneiros da antiga cidade… das compras em Barreiras (BA), que se faziam em lombos dos animais e a pé; da velha tropa de burros de Xavier... Saudade desse lugar, do seu espírito acolhedor, solidário, com que um dia acolheu a mim e a minha família… Assim, posso confirmar que, com Campos Belos (com sua história e sua gente), tenho mesmo uma recíproca história de amor a contar.
29:03:19 Site Recanto das Letras

Local de Nascimento: Palmeiral MG

Local onde vive: Ribeirão das Neves MG

A Arma de Mamãe

No silêncio da noite um grilo chirriava do lado de fora da casa; um friozinho aproximava a passos lentos; a lua na sua costumeira trajetória e brincadeiras, ora e outra se mostrava e se escondia entre as nuvens. Ao percorrer a sala com os olhos procurei às horas, e o mover do pêndulo do relógio-de-parede retratava a minha pessoa; inquieta, pela demora da mamãe para irmos ao templo cultuar a Deus. Fui sua companhia por anos nessa minha obrigação religiosa, na caminhada da fé cristã... agora, meio desanimado, tenho menos fervor...
De longe ouvíamos o clamor do "glória Deus" e "aleluia" dos irmãos na congregação e apressamos os passos.
Como o cão anda solto...
Naquela noite à fera de Luiz Bode, no terreiro, resolveu atacar a mamãe: a dentadas, a todo custo. — Não havia nele sinais de desistência do seu intento. Não se importava aos nossos gritos, de "sai para lá cachorro"... O bicho não desistia.
Até que a mamãe lembrou-se da sua arma poderosa: e mostrou a Bíblia Sagrada a ele. Aquilo foi como um jogar de água ao fogo: o vira-lata, como se tivesse recebido uma repreensão superior, retraiu-se de imediato de sua maldade. — Sem graça, saiu com o rabo entre as pernas, de volta à casa do seu dono; e não mais se meteu a besta com a serva de Deus.
05:06:17 - Página 183 do livro “Faço Parte Dessa História”

Formação Acadêmica: Gestão Ambiental

Livros publicados: "Faço Parte Dessa História" (coautoria)

Um Exemplo de Vida

Isabel Vieira de Moraes, sempre fora uma pessoa dedicada a Deus, desde a sua primeira infância. Amá-Lo e servi-Lo (em obediência) sempre foi o seu maior prazer, no percurso terreno que fez. Bondade, sabedoria e ternura eram algumas das suas características peculiares. A lealdade aos seus princípios de fé e crença (em firmeza de propósito ou de caráter) sempre fora o seu norte. Viveu a se dedicar-se à causa do Evangelho de Cristo; e em qualquer conversa que tivesse com alguém, nunca deixava de falar do amor de Nosso Senhor Jesus. E a lançar a essa pessoa, um convite a crer n’Ele e aceita-Lo como Salvador de sua alma.
Eu e meus irmãos fomos agraciados em ter tê-la como a nossa mãe; por deixar a nós (os filhos) sua marca, o seu exemplo e educar-nos com o melhor que tinha, no tocante aos bons princípios morais e espirituais. Inegável gesto, esse, próprio da grandeza de uma santa mulher.
Reprovou, e, relutou incessantemente, contra as influências contaminadoras do mau que tão de perto nos rodeia, no mundo pecaminoso que vivemos. Pois, a prendeu desde cedo com seus pais a “amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”, conforme o mandamento Santo. Damos graças a Deus por sua vida, fé e crença; bem como o repasse dessa virtude a nós (os filhos). De maneira que, estamos muito felizes e agraciados por ter-nos conduzido até aqui, em amor e dedicação; e por ser temente ao Senhor, nos deixar tamanho legado.
Gratidão ao Nosso Pai celestial, por ter nos dado essa pessoa tão abençoada e abençoadora que foi a nossa mãe! Não é possível mensurar o valor de Sua tamanha dádiva, por muito exceder o nosso entendimento. O seu amor a nós fora incondicional e dividido de igual modo a todos os filhos. Para que não houvesse desproporção dessa virtude em nenhum de nós. Renunciou o que pôde, pela família: quando no dia a dia se dedicava mais a esta, do que a si própria; a lição fora ensinada, sua missão cumprida. Que Ele, o nosso Deus, nos dê a graça de Seguir o máximo, do tudo o que ela nos ensinou.
10:09:15

EMAIL: nem1000son@gmail.com

Um Presente do Amado

Final da década de 1940, ia com a mamãe à quinta, — terreno formado de pastagens para os animais, — buscar lenha, quebrar cocos babaçu... um tatu descansava no tempero a ser cozido no leite de coco.
Éramos muitos irmãos e mamãe nos ensinava os afazeres domésticos. — Bem como à culinária, a limpeza das vasilhas, da casa; o cuidar dos bichos. Fazíamos tudo com muito gosto e capricho, o que nos fosse proposto a fazer, sem reclames. A mamãe era uma pessoa simples, humilde e boníssima ao extremo; e temente a Deus acima de tudo. O filho costuma ser a cópia dos pais em tantos aspectos... não me lembro de contendas lá em casa; umas rusgas devia haver, mas nada que atrapalhasse a nossa convivência familiar. O papai era um poço de bondade e vivíamos rodeados por todos os lados de muito carinho e amor; éramos realmente felizes.
Usávamos as vassouras de raminhos de beira de estradas, feita por nós mesmas — para varrermos a casa, o terreiro. Já éramos casados quando aconteceu um momento marcante na minha vida... Meu esposo e primo, o Natã, veio na minha direção com um embrulho nas mãos e ficamos por alguns instantes, estáticos, a nos olhar... Os meus olhos pequenos brilhavam como uma constelação inteira; e o meu coração pequeno, não me dava sossego, a insistir num descompasso sem medida; num baticum sem fim. Seria mesmo o quê? me pus a imaginar.
— Ofereço-lhes estas lembranças com muito carinho, faça delas um bom uso; é a melhor coisa que lhe desejo, e que alguém pode dar ou receber: não pela importância econômica, mas por seu valor espiritual.
Foi o primeiro e o melhor presente que recebi na vida. Eu nem sabia que existia essa coisa de “presentes”; fiquei numa felicidade extrema, num estado de graça mesmo. Mostrei as lembranças que acabara de ganhar, à mamãe e contei-lhe quem havia me dado. Ao abrirmos o embrulho, era uma linda Bíblia Sagrada e uma Harpa Cristã (hinário da Assembleia de Deus) e ela ficou feliz assim como eu.
Naquele tempo não se encontrava Bíblia, harpa em qualquer lugar para se comprar: e raríssimas pessoas podiam adquirir esses materiais religiosos. É possível alguém ter morrido no desejo de possuí-los. Muitos irmãos de fé da nossa igreja, iam distantes das suas residências, a pé, para participar dos cultos evangélicos.
O meu papai era cristão, agricultor; nas suas roças cultivava: feijão, arroz, milho, algodão, melancias e outros mantimentos de subsistência familiar e ficou feliz também com os meus presentes que ganhara do meu esposo, ao chegar do trabalho.
À noite demorou a chegar (pela minha ansiedade) e formos ao culto com o material religioso, novinho em folha, que poucos possuíam; queria logo, contar às bênçãos, mostrar aos irmãos da igreja, e a quantos pudesse, o que de mais importante havia ganhado. Mas, havia uma tristeza comigo: eu não sabia ler, e não podia acompanhar os cânticos congregacionais pelo hinário e nem às leituras bíblicas.
Contudo, isso não foi o meu fim: anos adiante, fui alfabetizada por ela (a Bíblia Sagrada) e a minha maior alegria estava em Deus. Vivo a desejar, que o mundo inteiro O veja e saiba o quanto é maravilhoso, e o que pode fazer por nós. Mesmo com algumas tristezas na vida, a verdadeira alegria é Cristo em nós. Ao conhecermos Jesus, não conseguimos mais conter tamanha alegria; e ficar calado, sem falar do Seu amor.
Do livro do autor: Faço Parte Dessa História.

É graduado em Gestão Ambiental pelo Centro Universitário UNA; escritor, membro da Academia Nevense de Letras, Ciências e Artes (ANELCA), cadeira n° 03, da Academia de Letras do Brasil, Minas Gerais, Região Metropolitana de Belo Horizonte (ALB/MG/RMBH), cadeira n°23; e do Núcleo Acadêmico de Letras e Artes de Portugal (NALAP); foi Conselheiro Municipal de Cultura de Ribeirão das Neves — MG, representando a Sociedade Civil Organizada, em (2017/18).

Caminho de Mamãe

O caminho de mamãe me leva a refletir sobre a importância do andar, e a direção a seguir. Um dia desejei ir, noutro instante, regressar. Percorrer esse caminho que a vejo trilhar me encoraja a caminhar.
Aprendi com ela (a mamãe) que, não é aqui o meu descanso e assim, caminharei… e a minha fé só aumenta, vendo-a no seu caminho santo todo dia a seguir. Preciso trilhar o bom caminho de mamãe (sem sair do trilho). Viver, sorrir, cantar, ser feliz e amar…como ela amou e viveu.
O caminho que mamãe escolhera para andar, é o mesmo que desejou que andemos, há nele um renovo espiritual a cada manhã (de peso eterno). Pelo caminho que mamãe andou e pela repetição desse andar (nas muitas idas e vindas) nunca mais nascera ervas daninhas, para atrapalhar os seu passos à Canaã celestial.
Antagônico ao caminho de mamãe, no propósito santo do andar, nem digo aonde pisei. Por isso, penei, sofri, chorei… a relva da desobediência invadiu minhas veredas a fazendo tortuosas e os espinhos me feriram.
Quem dera eu passar por onde a mãe passou, percorrer o seu caminho; ter um ninho como o que nos criou e viver o que ela viveu, sentiu... na dinâmica caminhada terrena que os seus pés trilharam.
2016. Página 195, Poetize

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À Mamãe

Minhas primeiras poesias não foram lá essas coisas: faltavam mais coerência, consistência e linearidade... apesar de feitas com carinho. Pensei não levar jeito nos meus modos de versar, por não escrever direito; mas, como um pássaro, me pus a voar, a construir melhor a minha escrita; a corrigir mais os meus defeitos...
Reconheci os meus tropeços, em algumas palavras fora do lugar ou desnecessárias; e achei mesmo não haver tanto sentido no que escrevia, ainda que vindo d’alma, às duras lavras, os meus rabiscos de poeta.
Segui adiante no meu ofício da escrita... e nas sucessivas aventuras na poesia, falei de amor a dois, um tema já tão explorado, em que os namorados não vivem mais essa afetividade no ardor de outrora; só ‘ficavam'.
Na insistência de vencer os desafios ao longo da caminhada, passei a adquirir mais confiança, clareza e contundência nas ideias. Mas, ainda em voos de pirilampos, interrompidos, na penumbra da noite, ao sabor dos ventos; longe do planar das grandes aves, em céu pujante.
"Lá Vem Mamãe" (é um grandioso texto de homenagem à mamãe) foi a prosa poética que mais amei das minhas produções textuais; e, como um troféu, guardei esse tesouro em lugar seguro: em meu coração, a sete chaves. Ao tecê-lo, desprendi de tanta ternura e esmero, que, não vi outro texto igual. A relíquia vive exposta perenemente, no nobre salão da minha alma, como terna fonte de memória a me inspirar.
Página 192 do livro autoral “Faço Parte Dessa História”.