Língua nacional

Autor: Antonio Paiva Rodrigues

Contato: celpaiva@oi.com.br

“O meu país não é minha língua, mas levá-la-ei para aquele que encontrar”. (Maria Gabriela Liansol, 1985).
Numa dessas noites quentes da vida, havia começado a escrever, apenas para chamar o sono. O idiota não vinha! Eu dizia: deixa, não me aporrinha, quero cochilar não desejo encarar, o novo dia chegar. O clarão faria a vista doer, a inquietação continuar, não conseguiria colocar no papel o quê desejava explanar. Minha memória falhou, vou procurar o doutor e desabafar total. De repente me lembrei: estou dando uma de intelectual, tenho que apor nas linhas o quê? A história da língua nacional. Eis que senão quando, senti algo estranho querendo adentrar no meu corpo e, num lugar para lá de esquisito. Assustei-me, era uma barata e a coitada matei. Inerte e sem vida estendida ao chão, o pobre inseto ficou a mercê de um espião. Meu cachorro de estimação, que sem nenhuma razão estraçalhou a coitada numa só dentada. “Estava ali desfrutando a suavidade noturna, o orvalho da noite, o prazer de me conhecer, o que eu estava a escrever, com aspecto de animal parecendo um irracional, não medi proporções: agitado, nervoso, irritado, veio à mente e de repente eliminei o animal, que por curiosidade só queria saber minha opinião sobre a língua nacional”.
Era um inseto aculturado, desses que têm o cuidado de não perturbar e aparecer, mas por um destino perdeu o caminho e foi comigo ter. “Na minha ignorância deixei a protuberância destruir uma vida, mesmo de um inseto que irrequieto queria saber, o que eu estava a escrever”. Num ato impensado já era passado. Cansado, aniquilado, procurei esquecer, foi neste momento de vil sofrimento que consegui adormecer. Não vi passar as horas, só sei que a demora deixou-me descansado, um pouco estressado, mas com uma incumbência a fazer. Papel prá que te quero? Para falar da língua nacional! É um idioma neolatino derivado do latim. Sua história começa antes da Era Cristã, quando os romanos dominavam a península Ibérica, hoje Portugal e Espanha, e impuseram seus padrões de vida e sua língua. Hoje tristonho, fico a meditar! Meu Deus uma língua tão linda, vive na berlinda sofrendo pelos acintes, porque a cultura insensata de nosso povo, não a quer abrilhantar. As várias etnias que lá existiam acabaram por se misturar ao latim falado pelos soldados romanos: o linguajar do povo, que não possuía forma escrita, um latim vulgar, ao contrário do latim erudito, mais rígido. Por não estar preso à forma escrita, o latim vulgar era mais variado e por isto não foi difícil surgir os dialetos, fruto das diferentes combinações em cada região. Até na língua o brasileiro sofre as conseqüências da natureza, sofremos influências de um latim vulgar, o erudito ficou para os mais bonitos e benditos, mas não me cabe julgar. Além da dominação pelo Império Romano, a Península Ibérica também sofreu invasões de povos germânicos (vândalos, suevos e visigodos), no século V da Era Cristã. De engodo já basta, estamos cansados, maltratados e para tudo que termina em godo não estou nem aí.
Herdamos alguns vocábulos, sendo a maioria ligada à área militar, tais como: guerra, marechal e general. As invasões dos árabes no século VIII também contribuíram para incorporação de novas palavras. Você sabia que geralmente as palavras começadas em “al” têm origem árabe? São exemplos: alface, alfinete, álgebra, alfândega. Das que não começam em “al”: garrafa, xarope e quintal. Brasileiro quer um pezinho para começar a andar, assimilou direitinho - a linguagem arábica vai se enfiando no álcool, alfinetando sem inimigos e amigos também. De álgebra têm horror, de alface nem pensar, de alfândega nem perto passar. Associa o álcool à cachaça, pensa logo na garrafa vai ao quintal bebericar e começa a xaropar.
Na história da língua nacional transborda verdadeiro carnaval de palavras encantadoras, mesmo do latim vulgar não temos o que reclamar. Mas se fosse do erudito ficaria mais bonito, talvez horripilante no sotaque do nordestino, no chiar do carioca, do paraense, do amazonense, parte de paroaras e de marajoaras, dos amanauaras a língua enrolada do paulistano a dizer: “Acoida meninão fecha o poitão aproveita e coita as unhas imundão”. E vêm as confirmações do carioca: “é mermo” camarada. Alegro-me quando vejo um mineiro viajar. Na sua pressa tradicional diz para a família: “prepara os trens queridos, que a coisa vai passar”. Os trens são os pertences e a coisa o trem.
Não posso me atrasar sô, mas antes de sair diga-me três palavras começadas com a letra “U”, só isso: Berlândia, Beraba, Batuba, estou indo sô, se não perco o horário da coisa. É engraçado minha gente - de muitão as variedades de costumes e sotaques que o brasileiro tem. Diamantizam de uma forma geral a língua nacional. Ou não? As influências germânicas e árabes não foram tão intensas quanto à dos romanos e por isto, as raízes latinas foram as que continuaram sustentando a cultura da península. A região que hoje ocupa Portugal se destacou do restante da península no ano de 1143, quando foi declarada a independência portuguesa, com o idioma galego-português. No sul, predomina o português, e, no norte o galego. Esta parte foi anexada pelo povo castelhano alguns anos depois e em 1290 o idioma oficial na Nação Portuguesa. “Galego no Brasil é conhecido como loiro sarará, igual a cachorro de madame enxerga mal de dia, uma tristeza a noite uma beleza”. Português é tão bonzinho, além de tornarem seu país independente, ainda fizeram a independência da gente.
Será por isso que fazem tantas chacotas com os patrícios, dizendo que Português só sabe fazer bem o pão. Por isso nos deu um pão grandioso de presente, aliás, uma mina, a Independência divina. “O que desviam de dinheiro e mandam para o exterior é brincadeira e ainda afirmam que é lavagem. Sujo ou não, temos que passar por ela com direito a sabonete, xampu e condicionador. Assim fica o dinheiro sujo depois de lavado. Com estas atitudes por falta de estudo o povo fica rude”. A língua oficial do nosso país é a Língua Portuguesa imposta pelos colonizadores quando chegaram à costa brasileira.
Aqui já se falavam vários dialetos indígenas, porém a maioria foi extinta para dar lugar ao idioma português. Se você leu com atenção sobre os nativos brasileiros, vai lembrar que, dos 1300 dialetos falados pelas diversas tribos indígenas em 1500 só persistem cerca de 180. “Não vá me dizer que não sabia, porque não tinha nascido ainda”. Durma-se com um barulho deste. Foi indagado a um determinado aluno se ele conhecia bem o português, ele afirmou que sim. Toda classe bateu palmas. “Ele na maior cara de pau disse: se for meu vizinho da esquerda - conheço-o muito bem”. Idiota, replicou uma voz bem baixinha.
Mesmo adotando o idioma de seu colonizador o Brasil possui modo de escrever e de falar que foram surgindo e imantando-se ao nosso povo com o passar do tempo. A Língua Portuguesa aqui é bem diferente da que encontramos em Portugal, além das variações que encontramos de região para região dentro do nosso país. Isso tudo porque um idioma não é algo estático parado no tempo. Se fosse, ainda estaríamos falando como Portugal no século XVI como tempo “d’antes”. Reparou como o poema de Fernando Pessoa mostra esta transformação? Sinceramente, de uma hora para outra fiquei cego, mudo e mouco. “Pensei cá com meus botões que lá em Portugal só existiam Manoel e Joaquim e Joaquim e Manoel. É verdade. Também existe uma quantidade enorme de Marias. No Brasil já não suporto mais falar em “Zé”. É de baixo é de riba, mas como têm Zé lá na Paraíba”. O importante é que nossa língua muda de acordo com a época e com os costumes. Lembro-me do jargão popular: “O uso do cachimbo é que faz a boca ficar torta”, mesmo em curtos espaços de tempo, através da publicidade surgem certos slogans (Parabéns, você falou difícil prá caramba), que modificaram e acrescentaram novas palavras e expressões.
O velho neologismo. Até o pobre do ministro que tomou doril, ninguém sabe ninguém viu Rogério Matos (nosso ex-professor) me enganei: Rogério Magri, da época do governo Collor (desgraçado levou meu dinheiro e ainda hoje estou com questão na justiça) ninguém usava o termo imexível (por saberem que tal palavra não existia ou por que não gostavam de inovar?), só para encardir o canelal vou usar os meus: (diamantizar, aurear, involuído) e quem quiser me criticar estou todas as noites na FGF (Faculdade Integrada da Grande Fortaleza), menos nos sábados e domingos. Muita coisa mudou e acredite. Cada um de nós contribuiu para que assim fosse e se assim não fosse, graça não teria. Gostaram.
Descobri uma coisa! Digo ou não digo? Não vou dizer, vou afirmar: com os olhos abugalhados ou abobalhados viram como temos várias línguas em torno da língua Portuguesa? Têm o português de Portugal, o português do Brasil e suas inúmeras variações regionais. E ainda o português das outras colônias (Não é perfume, nem água de cheiro minha gente) não é tão complicado, porque, no final das contas, todas estão sujeitas às regras e formalidades do idioma representadas pela Gramática da Língua Portuguesa. “Deus meu pensei que só mulher tinha regras, no final as contas novas - agente deixa envelhecer e às velhas ninguém paga” - caí no conto do bobo, pois quem está me devendo não vai querer pagar respaldado justamente nesta assertiva.
Para concluir queria dizer que a crônica é a visão do mundo que a pessoa a tem acrescida com um pouco de charme, de graça, para que o monótono não apareça. A sua forma de ver e questionar o mundo ao seu redor é importantíssimo. Além de observar mais atentamente a pessoas e situações que fazem parte do seu dia-a-dia, o exercício de sua redação ao tentar construir textos claros, tornam as pessoas mais criativas. E tem muita lógica em nossa afirmação. Do que foi exposto aqui considero a língua portuguesa riquíssima e se faz necessário que todos sem exceção, estejamos acompanhados pelo pai dos sábios: O dicionário. Que os menos avisados chamam ou apelidam como o “pai dos burros”. Estamos prestes a comemorar o dia Língua Nacional e dedico a nossa um poema de Fernando Pessoa de 1930: “A nossa magna língua portugueza”. E nobres sons é um thesouro. Seccou o poente, murcha a luz represa. Já o horizonte não é oiro: é ouro. Negrou? Mas das altas sylabas os mastros. Contra os céus vistos nossa voz affoite. “O claustro negro céu alva azul de astros, Já é noute: é noite”.


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