Era noite

Autora: Alethea Borsari Peraro

Contato: alethea_eu@hotmail.com

Era noite. Ou talvez não fosse. Não sei, sempre foi escuro. O quarto é escuro, apertado, mas é aconchegante. É claro que há goteiras, água por todo lado, mas sempre foi assim, faz parte da decoração. Estive aqui por tanto tempo, toda a minha vida, eu diria, mas sinto que logo terei que partir. Não podemos permanecer para sempre no mesmo mundinho, embora eu goste muito daqui. Sentirei falta, mas sei que é preciso partir.
De repente uma porta se abre. Luz! Será que é dia? Como saber? Com tantas lâmpadas, postes, letreiros, já não é possível saber ao certo quando é dia e quando é noite. De qualquer forma é melhor tomar um banho, todos esperam. Todos sempre esperam algo, e continuam esperando, não largam esse vício. A vida nada mais é do que uma contínua espera pela morte, e procura-se passar o tempo fazendo qualquer coisa para essa espera não parecer em vão. Mas quando chega o momento... tudo a seu tempo, é melhor esperar.
Vou à presença de todos. Ou será que eles é que vem me ver? Repouso. Todos me olham. Uns choram. Não compreendo. O momento da mudança é tão esperado, por que choram? Não percebo se estão contentes ou tristes. O silêncio predomina. Eu também faço silêncio. Será que esperam algo de mim? Um movimento, uma palavra talvez. Sabem que não posso falar.
Novamente esperam. É só o que fazem. Eu também esperei, e o momento chegou. Devo continuar esperando?
Engraçado como o nascimento e a morte são parecidos. Ambos são momentos de espera para uma completa mudança na rotina.
Chegou o momento. Como já foi dito antes, quando chega o momento, a maioria muito temerosa quer desistir. Esperam tanto por esse momento e agora querem voltar atrás, todos temem a mudança, mesmo quando são outros os que mudam, pois quem atinge esse momento nunca consegue contar como ele é... mas não sabem dizer como era antes, então, para que o medo se não lembrarão do momento em que tudo era diferente? Não poderão mais fazer o que faziam em sua espera, mas se faziam para esperar, o objetivo foi alcançado. Bando de loucos! Ou então, terão que sair da inércia e começar a fazer um milhão de coisas que nem imaginavam que existia enquanto esperam novamente.
Não é mais possível adiar. A espera acabou. Ou já havia acabado? Não sei, ninguém me avisou. E quem sou eu para saber?
Não posso mais ficar com vocês, queridos leitores, devo deixá-los. Não me esperem, mas continuem esperando. Alguma coisa, qualquer coisa. Sei que querem mais explicações, mas assim é a vida. E a morte. Quando menos se espera, já é preciso mudar. Tendo entendido ou não. É preciso ir agora, pois ainda há muito o que esperar.


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